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  • Foto do escritorElio

De Flores a Faro

Flores é um dos poucos lugares no mundo que me apaixona plenamente.


Suas cahoeiras, suas falésias, os lagos aprisionados na boca de vulcões extintos, suas flores e águas cristalinas, formam um cenário único.

Os habitantes são incríveis. Pescadores e agrucultores. São simples e cheios de sabedoria. Herdeiros dos pescadores de bacalhau, que se aventuravam nas banquisas de Terra Nova e ousavam penetrar o Mar de Baffin, estão sempre dispostos a ajudar.


Mas era hora de planejar a partida. O último trecho da travessia iniciada em Quebec (Canadá), com destino a Faro (Portugal) tinha que ser concluído.

O quadro apresentava alguns pequenos problemas. O mais crítico era relacionado à meteorologia. Dois grossos centros de baixa pressão estavam se deslocando paralelos em direçãp NNE (Norte-Nordeste) ocupando quase toda a nossa rota, que era praticamente Leste. Não teriamos condições de atravessá-los. Entre eles uma zona sem vento que, à medida que eles fossem subindo, ia se abrindo nos deixando sem vento.


Na primeira metade do caminho encontrariamos mar grosso vindo de NNO e, na segunda metade, mudaria para NNE. Portanto já fui preparando a tripulação para o que iriamos enfrentar.

Acreditando nas previsões para os próximos dias, minha estratégia era, pegar a parte de baixo do primeiro centro, arriscar dois dias de motor quando os ventos diminuissem a intensidade ao sairmos deste centro, e alcançarmos o segundo centro, cujos ventos nos levariam a Portugal.

Expliquei o plano ao Armando, o proprietário do barco, ele concordou e partimos.

No hemisfério norte os centros de baixa pressão circulam no sentido anti-horário, portanto os ventos na parte inferior deles, seriam extremamente favoráveis. O único senão seriam os dois dias de motor, que poderiam comprometer a quantidade de combustível necessária para adentrarmos em Faro.

Estes dois dias de motor seriam fundamentais para atravessarmos uma região com pouco vento.

Um outro problema adicional era que não tinhamos cartas náuticas em papel, apenas um Navionics num tablet, então eu tracei minha rota mental além daquela no tablet.

Ah, abrindo um parentesis: Se vocè usa cartas eletrônicas em tablet atenção com o iPad da Apple. Existem duas versões de iPad: com e sem possibilidade de colocar chip.

O iPad sem chip NÃO tem GPS. O pior de tudo é que se vocè perguntar nas revendas Apple se o iPad sem chip tem GPS eles vão responder que SIM. Aí, você põe carta eletrônica, sai para o mar e, quando não estiver mais no alcance de telefonia ele simplesmente não se localiza mais e você fica na mão!!!! Voltemos à nossa viagem

Era mês de julho. No fim de janeiro o Sol estava quase sobre o Trópico de Cancer (23°N aprox.), portanto agora estaria próximo ao Equador. Logo, o rumo a ser mantido deveria ser de aproximadamente 35° em relação ao lugar onde o Sol nasce.

Partimos, todo pano, e ondas grossas batendo como previsto. Em média tinham 3 metros e peíodo curto. O barulho era forte, o pessoal tinha dificuldade em dormir. Todos preferiam dormir na sala onde o barulho das pancadas das ondas era menor. Após alguns dias o vento, mas não as ondas, foi diminuindo. Era chegada a hora de motorar. Ligamos o vento de porão (o motor), e continuamos apontando mais ao norte. Estavamos na direção um pouco acima de Lisboa.

Talvez você se pergunte qual a razão de apontar mais ao norte do que Lisboa se o destino era Faro ou Sagres que ficam ao sul. Simples: é sabido qu o litoral português é percorrido por uma corrente que vem do norte e que costuma ter mais de 0,5 nós.

Como se atravessa uma corrente no menor tempo possível? Perpendicular a ela! Portanto não é perpendicular à terra!

Se eu chego onde a corrente atua, na altura do paralelo de Lisboa, enquanto eu atravesso perpendicular a ela (menor tempo de travessia), ela terá me arrastado um pouco abaixo do farol que marca Sagres, onde eu queria chegar.

Dois dias depois, como previsto pela meteorologia, saimos da região sem vento e começamos a pegar a rabeira do segundo centro de baixa pressão.

De novo as ondas batendo forte vindas de bochecha, minha valente tripulação, com olhar de súplica perguntava quando aquelas pancadas acabariam e, a exemplo do belo e valente catamaran de 47 pés, aguentava firme.

Depois de 3 dias eu estava dormindo quando as manifestações de alegria explodiram me acordando. Estávamos 5 milhas ao sul do Cabo de Sáo Vicente! Ele marca a entrada de Sagres. Terra a vista! E foi descoberto Portugal.

Os olhos do Armando e de sua esposa Carla brilhavam. Imaginei a emoção deles ao voltarem a seu País, chegarem a bordo daquele veleiro tão sonhado e fruto de tanto esforço, rever os miudos (filhos) e respirar aliviados depois de um duro trecho. Deve ter sido algo mágico.

Quando chegamos na entrada da ria de Faro, fiz questão que o Armando e a Carla entrassem no comando do barco. Era o triunfo deles. Eles tinham aprendido muito e poderiam estar orgulhosos do que fizeram.

Quanto à minha amada Helena, apesar de fisicamente ter sentido muito as condições do mar, foi valente e sempre pronta a me ajudar. Ela chegou diferente de como partiu. A água salgada agora faz parte de suas veias. É bom ter ao lado alguém assim.

Só tenho palavras de agradecimento a essas três pessoas esplêndidas. Obrigado.

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