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Um relógio Incrível por menos de 5 reais!


Que tal ter um relógio que funcione sem pilhas nem dar corda, que ninguém deseje roubar, que flutue se cair do barco e continue funcionando?

Vejam só o que me aconteceu no dia 2 de maio de 2020:

Estava conversando com a Helena a respeito dos fusos horários e tomei como exemplo duas cidades próximas - uma perto da que estamos, Narbonne ( 43.1843 N, 3.0031 E) e uma outra, mais a oeste, que se chama Perpignan (42.6887 N, 2.8948 E).

Com a ajuda do Santo Google encontrei imediatamente que, em Narbonne, o Sol nasce às 6:40, enquanto em Perpignan nasce às 6:41.

Claro, disse eu cheio de empáfia! Perpignan está mais a oeste, portanto, o Sol ilumina primeiro Narbonne e depois Perpignan.

Continuando com meu raciocínio, perguntei-lhe: Onde você acha que o Sol se porá antes? Ela, como boa aprendiz, respondeu imediatamente: Narbonne.

Fomos então verificar a hora em que o Sol se punha nas duas cidades e… quebrei a cara!

Em Narbonne, o por do sol seria às 8:51, enquanto que, em Perpignan, às 8:50.

Tive então que explicar como a latitude também importa para determinar a duração dos dias, em função do mês. Neste dia, o Sol em Narbonne fica visível 2 minutos a mais do que em Perpignan!

Mais tarde busquei entre meus objetos pessoais, um relógio cuja foto está aqui.

Este relógio, que chegou na praia flutuando quando tive o acidente com o Crapun, havia sido comprado em uma loja, chamada Polvere di Tempo, em Roma. Claro que passei a tarde dentro desta minúscula loja e o proprietário, um argentino radicado há muitos anos na Itália, teve muita paciência para me explicar como ele fabrica as ampulhetas, os astrolábios e mais uma série de velhos instrumentos hoje totalmente superados. Poeiras do tempo…

Este relógio tem um valor sentimental muito grande para mim. Poeiras de uma viagem...

Ele é muito simples de ser usado. Basta colocar o norte da agulha em cima do norte escrito na bússola, abrir bem a tampa de modo que o fio fique esticado e a sombra do fio marque a hora.

Olhando o relógio você pode ver que existem uma série de furos, na madeira que está na posição vertical. Ele me explicou que, dependendo da cidade da Europa que você se encontre, o furo por onde o fio passa deve ser mudado, pois cada cidade tem sua hora. Imediatamente eu disse: "Claro, muda a longitude".

"Não", respondeu ele, "muda a latitude!"

Confesso que sai da loja meio confuso… mudando a latitude, a hora muda na mesma longitude?… Ué… e o Meridiano de Greenwich? E aquilo que está nos livros de náutica?

Calma, os livros de navegação estão certos e o seu professor lhe ensinou corretamente.

Suponhamos que você vá caminhando ao longo de um meridiano que une os dois Polos. O que vai mudar ao longo do meridiano é a duração do dia, não a hora que o relógio marca. O relógio de pulso (ou cronômetro) marca a divisão do dia Solar médio, em 24 horas iguais. Explicando melhor: duas cidades no mesmo meridiano, uma mais ao norte e outra mais ao sul, terão a mesma hora, mas o dia em uma delas será mais longo do que na outra.

Agora é primavera no hemisfério norte e outono no hemisfério sul. Os dias vão ficando cada vez mais longos no Hemisfério Norte e mais curtos no Hemisfério Sul.

Então, a sombra de um poste, colocado perpendicular à rua, vai ficando cada vez mais longa no Hemisfério Sul e mais curta no Norte (sempre à mesma hora de relógio).

À medida que os dias forem passando, chegará o inverno, quando os dias ficarão mais curtos no Brasil e as sombras ficarão compridas.

Se você olhar a sombra de um poste em São Paulo, sempre ao meio dia, vai ver que a sombra dele, na primavera brasileira, começará a encurtar até chegar o verão brasileiro. Exatamente no dia do Solstício de verão, ao meio dia sua sombra estará exatamente em baixo dele. Em todos os outros dias, o poste sempre terá sombra.

São Paulo está no Trópico de Capricórnio. As sombras aumentam de tamanho até o Solstício de Inverno, depois voltam a diminuir e passam a ter tamanho mínimo, no Solstício de verão. E assim a natureza vai marcando as estações do ano.

Já para nossos amigos gaúchos ou catarinenses, o poste nunca ficará sem sombra, pois estão abaixo da linha do trópico de Capricórnio. Por essas bandas, no dia do Solstício de verão, a sombra do poste terá o menor tamanho, de todo o ano!

Em compensação, nossos amigos de Salvador terão dois dias, por ano, em que o poste ficará sem sombra. Um quando o Sol estiver indo em direção ao Trópico de Câncer e outro, quando ele estiver voltando em direção ao Trópico de Capricórnio.


Por isso o relógio de sombra depende da Latitude, para longitudes quase iguais.


Os romanos seguramente conheciam isso e, muito provavelmente, o que aconteceu nesse pequeno filme, deveria ser rotina naquela época. Por isso mantive a locução original.

O meu amigo Pietrus, descendente direto de Julius Caesaris ;-)) , perguntou-me: "Quod tempus est?" (ou seja, que horas são?). Tirei do bolso meu Super Relógio Astronômico Sômbrico Indestrutível e repliquei: "10:15".

A Helena, que estava filmando, mostra ao fim da gravação o relógio eletrônico, que marcava 10:14; portanto, um pequeno erro de um minuto. Aceitável. Convido-os, então, a construir um Super Relógio de bolso como o meu e compartilharem comigo informações sobre seu funcionamento!


Material necessário:

- Duas madeirinhas de 8 X 10 X 1cm;

- Uma pequena bússola, dessas chinesas mesmo (custa menos de 5 reais);

- Uma pequena dobradiça (pode usar esparadrapo), para fazer as duas madeiras movimentarem-se, abrindo e fechando;

- Um pedaço de linha e uma broca pequena para fazer os furinhos;

- Paciência, carinho e óleo de cotovelo :)


Construção:

1) Faça o furo para colocar a bússola. O centro do furo deve ser feito a 4 cm da parte onde vai a dobradiça e, obviamente, a 4 cm de cada lateral. Assim, o furo não ficará centralizado no meio do retângulo, mas deslocado 1 cm mais para cima, mais próximo de onde vai a dobradiça. A minha bússola tem 2,5 cm de diâmetro;


2) Cole dois papeis brancos nas madeiras, um em cada bloco, na face onde você fará as marcações das horas. Não use cola forte, pois será necessário retirar esses papéis, para substituí-los por um papel mais bonito e definitivo, com figuras e enfeites, onde você copiará as horas.


3) Faça um furinho a 3,5 cm da borda inferior (aquela oposta de onde está a dobradiça) e outro, na outra madeira que servirá de tampa, a 4,5 cm do topo (portanto, 5,5 da base onde está a dobradiça);


4) Prenda a dobradiça;


5) Cole uma das pontas do fio naquele furo que está logo abaixo da bússola. Passe a outra ponta pelo furo da madeira que servirá de tampa e saia com ele na parte de trás. Do lado de fora da tampa coloque um preguinho ou um alfinete cortado com um pedacinho de papel grosso (eu usei couro) e dê umas voltinhas de fio neste alfinete, para prendê-lo.

Se você seguiu corretamente as instruções conseguirá controlar o ângulo de abertura da tampa em relação à base. Fio mais curto supõe que a tampa fique mais na vertical, fio mais longo, supõe que a tampa repousará mais aberta.


6) Espere um dia de Sol e comece a usar. A sombra fará um V. Uma perna do V ficará na base e a outra, ficará na tampa.

A cada hora você marcará tanto na base como na tampa.


Viu que legal? É como se houvesse um espelho dividindo o ângulo entre a base e a tampa, em dois. A imagem de cima é o enantiomorfo da de baixo! É como se você estivesse diante de um espelho: ao levantar a mão direita, sua imagem projetada levanta a esquerda e elas não são iguais! Nem opostas! Elas são enantiomorfas. Tente colocar a luva da mão esquerda na mão direita; não dá!

Pronto! Seu relógio à prova de água, que funciona sem pilhas e nem precisa dar corda, está funcionando.

Notem no filme que eu alterei a inclinação. Foi para conseguir ajustar para o local onde estou. Com 90 graus de inclinação, ele funcionava bem em Roma, aqui tive que ajustar a hora para o fuso de sombra local.


Detalhes:


a) o meu tem o Norte da bússola apontando para cima, o seu deverá ter o SUL apontando para cima;


b) Aqui praticamente não existe declinação magnética, mas no Brasil ela chega a ser de mais de 20 graus, portanto, faça a correção e isso será fácil, você aprendeu isto quando fez o exame de Arrais!

Agora, você vai se divertir muito, enfeitando seu relógio e imagino a expressão dos seus amigos quando, num churrasco, você disser que sabe que horas são com o relógio que você construiu! Será um sucesso, com boas risadas, conversas regadas a cerveja, churrasco e aquele espírito de fraternidade que, entre velejadores, é a norma.

Divirtam-se e caso tenham dúvidas, sabem o meu email crapun@gmail.com


Nota importante: Em toda a explicação acima, não levei em consideração a analema para não complicar o raciocínio, mas existem algumas aproximações , aquilo que, na época de estudante, chamávamos de Le Cochambrè, célebre cozinheiro francês. (acochambrei...: )

Se desejar realmente conhecer melhor o movimento aparente do Sol, essa referência -www.if.ufrgs.br/~fatima/fis2005/arquivos/eqtempo.htm - possibilitará um bom começo.


Obrigado pelo carinho.


Elio Crapun

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2 comentários


Daniela Pivari
Daniela Pivari
03 de set. de 2020

Elio! Demais esse relógio! Estou tentando fazer!!


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Paulo Toledo Arruda Jr
Paulo Toledo Arruda Jr
11 de mai. de 2020

Maravilha! Elio, seus textos sempre são muito bacana!

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